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17_02

HIPÓTESES


No decorrer da história, o ser humano foi desenvolvendo cada vez mais seu intelecto. Uma das consequências disso é que hoje ele anseia por compreender as coisas, e não simplesmente observar fenômenos sem conseguir entender por que eles se passam. Também não lhe agrada aceitar leis e regras sociais sem compreender sua razão de ser, ou admitir teorias sem que elas lhe façam sentido, sejam logicamente coerentes e correspondam ao que ele pode observar fora e dentro de si. Parece-me que cada pessoa moderna deveria ter uma concepção consciente do mundo, uma cosmovisão (Weltanschauung); a partir dela, deveria orientar seus pensamentos, sentimentos e ações. Em termos de concepções de mundo, é importante separar o que é hipótese de trabalho e o que é crença; vejamos as características de cada uma, salientando as diferenças entre elas.
Uma hipótese é uma afirmação que é tomada como verdade e serve de base para comprovações experimentais ou para uma teoria. Esta última pode envolver várias hipóteses, e consequências das mesmas sendo, portanto, muito mais ampla. Uma característica fundamental de uma teoria é a sua coerência lógica, isto é, não deve haver contradições entre suas várias hipóteses e entre as afirmações que delas resultam.
Portanto, uma hipótese é a base para alguma compreensão conceitual de observações experimentais, isto é, para a associação mental correta entre uma percepção correta e um conceito correto, ou para a associação mental correta entre conceitos corretos que se relacionam entre si. Note-se a presença da palavra "correto" – vou admitir que existem percepções, conceitos e associações corretos e incorretos. Por exemplo, se o leitor olhar para a entrada da sala em que está e se o seu sistema visual for saudável, certamente terá inicialmente uma percepção correta de impulsos luminosos; em seguida, fará uma representação mental do objeto visto e, finalmente, fará, com o pensamento, uma associação correta com o conceito "porta". Em geral, diz-se que se "vê" uma porta, mas na verdade o que se vê são impulsos luminosos; "porta" é um conceito, uma ideia, e não pode ser visto com os olhos. Chega-se a ele por meio do pensamento, e não de uma percepção sensorial. Um contra-exemplo seria ver-se uma pessoa ao longe, e não se conseguir distinguir se é um homem ou uma mulher. Nesse caso, provavelmente está havendo um erro ou imprecisão na percepção, o que pode ser conscientizado pela dificuldade em associar à representação não nítida correspondente um dentre os dois conceitos possíveis. Um outro contra-exemplo seria ver-se o Sol movendo-se durante o dia no céu, e se fazer a essa percepção correta uma associação mental com o conceito incorreto do movimento dele em volta da Terra, em lugar de se associar a essa percepção o conceito correto de que ele está parado e a Terra está girando em torno de seu eixo.
Uma crença é uma afirmação tomada como verdade, sendo a base para uma visão de mundo que pode não envolver, parcial ou totalmente, uma compreensão conceitual. Uma crença não deve depender de comprovações experimentais. Pelo contrário, ela fecha as portas à compreensão e à investigação.
Uma hipótese deve ser formulada claramente, por meio de conceitos, e basear-se em evidências, seja por meio de observações da realidade, ou de teorias coerentes e abrangentes delas derivadas. Além disso, deve estar sempre sujeita a revisões.
Uma crença não precisa ser formulada com clareza, pois não se dirige ao intelecto; ela é aceita como verdade, e tem um caráter de permanência, isto é, não é sujeita a revisões.
Uma hipótese deve ter um caráter de objetividade, de universalidade e, portanto, não deve basear-se em sentimentos pois estes são sempre subjetivos e individuais.
Ao contrário, uma crença pode envolver conceitos (já que é impossível falar-se sem usar conceitos), mas deve basear-se fundamentalmente em sentimentos, isto é, deve ser essencialmente subjetiva: "sente-se" que uma crença é verdadeira.
A atitude científica é uma das maiores conquistas da humanidade, tendo começado a desenvolver-se efetivamente, como potencialidade para todas as pessoas, após o início do século XV. Antes disso, ela aparecia de maneira parcial em um ou outro indivíduo. Ela deve ser aplicada sempre que se faz uma observação e a descrição de algo, e quando se formulam conceitos. Nessas atividades cognitivas, parece-me que essa é a atitude correta para o ser humano moderno, isto é, uma pessoa que não adota uma atitude científica na parte cognitiva de seu dia-a-dia está retornando indevidamente ao passado. No entanto, é preciso reconhecer que essa atitude não se aplica a toda a vida humana, pois nem tudo nela é cognição, como descreverei depois de expor aquilo que considero suas características fundamentais.
Na cognição, adota-se uma atitude científica se os seguintes requisitos forem satisfeitos:
Ter hipóteses de trabalho, e não ter crenças.
Mantém-se uma curiosidade constante, isto é, procura-se sempre conhecer coisas e ideias novas. Se um fenômeno é observado e não compreendido, deve-se observá-lo de todos os ângulos possíveis e estudá-lo a fim de compreendê-lo. Se uma ideia não é compreendida, ou parecer estranha, deve-se fazer um esforço para estudá-la e compreendê-la.
Essa atitude significa que se deve ter um interesse por quaisquer tipos de fenômenos ou de teorias.
Um contra-exemplo a essa atitude é o fato de muito poucas pessoas saberem por que os aviões sustentam-se no ar, apesar de os verem com frequência. A compreensão desse fenômeno, devido a uma propriedade dos fluidos descoberta em 1738 por Daniel Bernoulli (1700-1782), é relativamente simples e pode ser demonstrada com imensa facilidade: basta assoprar por sobre uma folha de papel fino com a borda superior esticada entre as mãos e encostada abaixo do lábio inferior, e observar como a folha sobe.
Há muito tenho afirmado que a falta dessa curiosidade constante pode ter um efeito indesejável: o desenvolvimento de uma paralisia mental. Segundo Platão, em Menon, Sócrates vai mais longe, pois diz: "Eu disse algumas coisas sobre as quais não tenho total confiança. Mas há algo pelo qual estou pronto a lutar, em palavras e ações, até o máximo de minha capacidade: Nós seremos melhores, mais corajosos e menos impotentes se pensarmos que devemos indagar, do que seríamos se cedêssemos à inútil fantasia [indulge in the idle fancy] de que não é possível, e não há utilidade, em saber o que não sabemos."

DOUTRINAS DA CRÍTICA DO CONHECIMENTO



Dentre todas as doutrinas da crítica do conhecimento; dogmatismo, ceticismo, probabilismo e pragmatismo, é o dogmatismo a única aceitável. Necessário se torna, porém, distinguir o dogmatismo exagerado que sustenta a possibilidade de uma certeza absoluta em todas as coisas, do dogmatismo moderado que admite uma certa relatividade na aquisição da certeza, devido ao poder limitado da nossa inteligência e ao caráter provisório dos conhecimentos científicos. O dogmatismo é, por conseguinte, a única doutrina em consonância com os dados da experiência e o senso comum. A verdade é um estado legítimo da razão, embora nem sempre a possamos atingir, pois a inteligência não é onipotente e existem problemas que ela é incapaz de resolver. Por isso, a ciência absoluta é um ideal que jamais poderá ser alcançado. Donde a necessidade da dúvida metódica como elemento propulsor do progresso científica. Mas entre esta dúvida relativa e prudente e a dúvida absoluta e universal que tudo nega e destrói vai um distância imensa e intransponível.

PRAGMATISMO



Esta doutrina não aceita o conceito tradicional de verdade considerada como relação de conformidade entre o pensamento e seu objeto. Se a verdade fosse uma adaptação do pensamento à realidade, dizem os pragmatistas, não haveria divergência entre as correntes filosóficas relativamente a essa verdade. O erro dos sistemas filosóficos resulta da função da inteligência e do valor do conhecimento. Os conhecimentos possuem um valor puramente instrumental, isto é, nada mais representa do que instrumentos ou meios para a consecução de certos fins práticos.
Assim, não cabe à inteligência dizer o que são as coisas, mas apenas mostrar em que elas nos são úteis e como nos podem servir. O pragmatismo não se interessa, por conseguinte, pelo que possa ser verdadeiro em si mas tão somente pelos resultados que advêm para a vida prática daquilo que se considera como verdade. A verdade se caracteriza, portanto, pela utilidade, pela eficácia, pelo sucesso que possa ter a ação. O conhecimento só é completo quando se efetiva no ato.
O pragmatismo, cujos principais representantes modernos são Pierce, Shiller, William James e John Dewey peca pela base ao confundir o conceito de verdade com o conceito de utilidade. A firmar que uma coisa é verdade é formular um juízo de realidade, enquanto que afirmar que uma coisa é útil é formular um juízo de valor. O conceito de verdade, refletindo a natureza real das coisas, é absoluto e universal, ao passo que o conceito de utilidade, variando no tempo e no espaço, é relativo e contingente. Outro erro do pragmatismo é esquecer o caráter racional do espírito humano que procura, antes de tudo, e de modo imperioso e irreprimível, conhecer, sem cogitar da utilidade das coisas. "O saber", dizia Amiel, "me satisfaz mais do que possuir, do que gozar, do que agir. A minha
maior satisfação está em observar, compreender e contemplar".



PROBABILISMO



Entre o dogmatismo e o ceticismo se coloca o probabilismo, que procura defender um ponto de vista intermediário entre essas duas concepções opostas. Na sua opinião, podemos atingir à verossimilhança, mas nunca à verdade. Nossos juízos são, mais ou menos, prováveis, sem nunca se tornarem certos.
O probabilismo representa apenas um ceticismo relativo, um ceticismo que não chega a afirmar-se. Aliás, ele se contradiz ao afirmar, pois dizer que tudo é "simplesmente provável" é afirmar e negar, ao mesmo tempo, uma certeza. "Nada mais absurdo" dizia Santo Agostinho, "do que querer aceitar a verossimilhança, ignorando o que seja verdade". Contraditório em teoria, o probabilismo é perigoso na prática, uma vez que ninguém deve expor sua existência, sua segurança, seu destino, baseado apenas numa aparência de verdade. A vida intelectual e moral não pode apoiar-se em simples probabilidades".



CETISISMO



O ceticismo afirma que não podemos ter certeza em coisa alguma. Todas as opiniões são igualmente incertas. A única atitude legítima do espírito humano é a da dúvida permanente e integral.

Quanto à sua extensão, distingue-se o ceticismo absoluto que se baseia na dúvida universal e o ceticismo relativo ou parcial que pode ser: tradicionalista, quando só admite as verdades da fé; histórico, quando nega o valor do testemunho; sensualista ou empírico, quando só acredita nos dados dos sentidos; positivista, quando rejeita a metafísica. Quanto ao seu objeto, distingue-se: ceticismo, que duvida da existência da verdade e do poder da inteligência para alcançá-la; o moral, que não admite distinção entre o bem e o mal; o religioso, que não aceita as verdades da fé.

O ceticismo é irracional e contraditório. Afirmar que nada se pode afirmar é contradizer-se; é proclamar que uma coisa é e não é, ao mesmo tempo. O ceticismo absoluto é, por conseguinte, impossível, uma vez que só se pode afirmar negando-se a si mesmo. É, além disso, inconseqüente, pois se conduz na prática, como se conhece-se a verdade. Os pensamentos, o raciocínio, as palavras, as ações dos céticos constituem um desmentido permanente à sua doutrina. Para serem coerentes com seus pontos de vista, deveriam eles condenar-se ao silêncio e à imobilidade. Pois pensar, querer e agir, implicam, necessariamente, o conhecimento e a afirmação de verdades. 

DOGMATISMO



O dogmatismo afirma que a verdade existe e que podemos conhecê-la. A atitude dogmática consiste em confiar em nossas faculdades intelectuais, em crer na realidade objetiva dos nossos conhecimentos e em acreditar que nossa inteligência pode atingir as verdades relativas ao homem, ao Universo e a Deus. O dogmatismo constitui, assim, uma doutrina de realismo e de senso comum.
Existe um dogmatismo verdadeiro que se baseia nos diversos critérios da verdade, e um dogmatismo falso que só admite um critério, com exclusão dos outros. Estão neste caso o fideísmo de Pascal e Huet que considera a fé como única base da certeza; o tradicionalismo de De Bonald e Lamennais, que coloca a certeza na dependência do testemunho universal dos povos; o sentimentalismo de Pascal, Rousseau e Jacobi, que a faz derivar de um instinto, de um sentimento, de uma inclinação natural; e o misticismo que pretende encontrar a verdade, com exclusão de toda atividade intelectual, utilizando apenas o êxtase místico.

CRÍTICA DO CONHECIMENTO



A crítica do conhecimento é junto com a ontologia e a teodicéia itens da metafísica.
A crítica do conhecimento, estuda a natureza, as possibilidades e os limites do conhecimento humano.
Crítica do conhecimento, também chamada noética ou gnoseologia, é a explicação ou interpretação filosófica do conhecimento humano. Seu objetivo é a determinação da natureza, dos limites e das possibilidades do conhecimento. Representa, por conseguinte, uma introdução necessária ao estudo da metafísica uma vez que esta somente se poderá se constituir, com autoridade e prestígio, baseada na certeza e legitimidade de suas investigações.
Nem todos os filósofos admitem que o homem seja capaz de conhecer a verdade. Quatro doutrinas básicas procuram lançar luzes sobre esse problema: o dogmatismo, o ceticismo, o probabilismo e o pragmatismo.

METAFÍSICA



Denominada filosofia primeira, por Aristóteles, a metafísica é a ciência das primeiras causas e dos primeiros princípios, isto é, a ciência que estuda os problemas que transcendem as realidades materiais sensíveis.

A palavra metafísica foi empregada, pela primeira vez, por Andrônico de Rodes para designar os livros de Aristóteles que vinham depois da física. Os filósofos medievais serviram-se dessa expressão para indicar a parte da filosofia que trata das coisas que ultrapassam a experiência sensível.

A metafísica, embora se possa inspirar nos dados das ciências experimentais, para ultrapassá-los e atingir a essência das coisas, não se confunde com nenhuma dessas ciências, uma vez que sua finalidade é estudar as conclusões últimas a que nos pode levar o estudo dos seres e fenômenos. O ser enquanto ser, o ser nos seus princípios supremos e nas suas razões fundamentais, independente e superior às suas manifestações sensíveis, eis o objeto da metafísica. A filosofia da natureza, ao contrário, estuda o ser concreto e particularizado nos diversos gêneros e espécies com que se apresenta no universo.