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23_04

O HOMEM É MAU

 


Mais temidos que leões

Experimento mostra que até os maiores mamíferos da África temem ser humano mais do que leões

"Não há um único animal humilde na Inglaterra que não fuja da sombra do homem, feito uma alma penada do Purgatório. Nenhum mamífero, nenhum peixe, nenhuma ave deixa de fazê-lo. Basta estender o trajeto da sua caminhada até o barranco de um rio e até os peixes vão disparar para longe de você. É preciso ter feito algo sério, acredite em mim, para ser temido desse jeito em todos os elementos que existem."

Essas palavras terríveis vêm da boca de um idoso rei Arthur em "The Once and Future King" ("O Único e Eterno Rei", numa das versões em português), série de romances de fantasia escrito pelo britânico T.H. White (1906-1964). Os livros, além de recontar o ciclo arturiano com delicadeza e paixão, investigam as tendências violentas da natureza humana pensando na relação entre a nossa espécie e outros animais. E, ao menos no que diz respeito ao parágrafo que acabei de citar, White acerta na mosca. Tudo indica que não existe predador mais temido do que o Homo sapiens na face da Terra.

Dados experimentais que corroboram essa ideia vêm de um estudo publicado recentemente na revista especializada Current Biology. O trabalho, coordenado por Liana Zanette, da Universidade Western, no Canadá, usou um sistema automatizado de câmeras e alto-falantes para tentar quantificar o medo, diante de ameaças, de uma ampla variedade de mamíferos africanos.

Estamos falando de 19 espécies que são exatamente o que você espera da fauna carismática da savana africana: rinocerontes, girafas, búfalos, hipopótamos, zebras, leopardos —o sonho de qualquer criança interessada em montar uma coleção de bichinhos de pelúcia, em suma.

Zanette e seus colegas instalaram seu aparato de pesquisa no Parque Nacional Kruger, uma das mais importantes áreas protegidas da África do Sul. Os aparelhos foram colocados, durante a estação seca, em torno de "water holes" —pequenos lagos, às vezes temporários, que são a principal fonte de água para a fauna da região em períodos de pouca chuva. Muitas espécies diferentes se reúnem em (relativa) paz em torno dos "water holes", de modo que esse tipo de lugar é ideal para estudar as reações de diversos tipos de mamíferos ao mesmo tempo.

Os alto-falantes em volta dos "bebedouros" podiam reproduzir uma série de sons diferentes: seres humanos conversando em línguas africanas comuns na região, barulho de armas sendo disparadas, cães latindo (os dois últimos seriam indício claro de uma caçada acontecendo), leões rugindo e vocalizações de aves. As câmeras, por sua vez, estavam prontas para registrar a reação dos bichos presentes aos sons. Design experimental mais simples que esse, impossível.

Autor: Reinaldo José Lopes

Jornalista especializado em biologia e arqueologia, autor de "1499: O Brasil Antes de Cabral".


CERTEZAS & INCERTEZAS

 


Se você acredita que está sempre certo, algo está errado

O diálogo é uma prática em extinção; a exposição de ideias, atividade de risco

Ignatius J. Reilly, o protagonista do romance "A Confraria dos Tolos", de John Kennedy Toole, tem certezas absolutas sobre tudo e todos. Mimado e intelectualmente pretensioso, Ignatius tem uma inabalável convicção na sua visão do mundo. Só que muitas das suas certezas não passam de meros delírios.

O livro, escrito em 1980, é uma sátira social perfeita para refletir a realidade que vivemos. Estamos rodeados de Ignatius, que se reproduzem como vírus. Acreditam tanto nas suas convicções —notadamente nas que escolhem acreditar— a ponto de desafiar a realidade. Quando menos fundadas, mais obstinadas são.

A ânsia por emitir opinião sobre tudo —elemento obrigatório hoje para "fazer parte"— equaliza ideias e pessoas, achismos e certezas. Informações superficiais e preconceitos agem como elementos formadores de opinião. Todos berram por ideais, mas são incapazes de explicar em voz baixa os seus fundamentos. A preguiça intelectual em buscar uma visão histórica os faz ter uma visão histérica.

O diálogo é uma prática em extinção; a exposição de ideias, uma atividade de risco. Emitir uma opinião "errada" no lugar errado é tão arriscado quanto se sentar na torcida de um time vestindo a camisa de seu oponente. Apenas à divergência do outro não se aplica a liberdade de pensamento. Resultado: rebanhos de carcaças ambulantes ecoando slogans, presos nas posições e não nas ideias.

As certezas são cláusulas pétreas e quem ousa delas discordar é automaticamente relegado ao posto de inimigo. Mais do que uma questão política ou ideológica, trata-se sobretudo de uma questão moral. O pensamento é automático: quem não pensa igual a mim é imoral, estúpido ou as duas coisas. As desavenças são resolvidas pela força, pela destruição, pelo ódio. Assim, se obtém carta branca para legitimar o racismo, o antissemitismo, a misoginia, a homofobia e tantas outras idiotices, tão temerárias quanto a fobia à alteridade.

Quem não é racional para questionar as suas certezas, também não o será para acreditar nelas. Se a discordância dos outros atinge de frente a identidade da pessoa, onde estará a consistência dessa identidade?

A busca pelo conhecimento não pode ser freada por crenças e preconceitos. O desprezo sumário pelo diferente gera uma deterioração semântica e uma falsa sensação de liberdade de expressão. É o que se vê nas ruas, nas universidades, nos cancelamentos, nas censuras.

John Stuart Mill, no clássico ensaio "On Liberty", escreveu: "Só por meio da diversidade de opinião, no atual estado do intelecto humano, há uma oportunidade de jogo limpo em todos os aspectos da verdade".

Novas verdades inevitavelmente sempre se apresentarão no nosso percurso. Somos dotados de um cérebro estruturalmente perfeito, constituído por um tecido mole que lhe confere flexibilidade e plasticidade. Mas os Ignatius da modernidade têm miolos mais enrijecidos do que os crânios que os abrigam. Mal sabem eles que é justamente a maciez do cérebro que absorve os choques e os protege de danos físicos. Preferem mesmo é bater cabeça e provocar concussões nas próprias mentes para que possam continuar a viver protegidos na confraria dos tolos.

Autora: Becky S. Korich

Advogada, escritora e dramaturga, é colunista da Folha de São Paulo


Para refletir


EXTINÇÃO DA HUMANIDADE

 

Protesto de ativistas do grupo Extinction Rebellion cobra medidas para proteção da biodiversidade em evento em Dublin (Irlanda) - Clodagh Kilcoyne 

Cientistas alertam que ramos inteiros da 'árvore da vida' estão sendo extintos

Nova pesquisa aponta para risco da sexta extinção em massa na Terra

Os seres humanos estão provocando a perda de ramos inteiros da "árvore da vida", de acordo com um estudo científico publicado nesta segunda-feira (18/09/23). A pesquisa alerta para a ameaça de uma sexta extinção em massa.

"A crise da extinção é tão grave quanto a das mudanças climáticas", enfatizou Gerardo Ceballos, professor da Unam (Universidade Nacional Autônoma do México) e coautor da pesquisa publicada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS, na sigla em inglês).

"O que está em jogo é o futuro da humanidade", afirmou.

O estudo não só analisa a perda de uma espécie, mas a extinção de gêneros inteiros. Na classificação dos seres vivos, o gênero se situa entre a faixa de espécies e família. Por exemplo, os cães são uma espécie pertencente ao gênero Canis, que, por sua vez, pertence à família dos canídeos.

"É uma contribuição realmente significativa, acho que é a primeira vez que alguém tenta avaliar as taxas de extinção modernas em um nível superior ao das espécies", afirmou Robert Cowie, biólogo da Universidade do Havaí (EUA), que não participou do estudo.

Logo, "demonstra realmente a perda de ramos inteiros da 'árvore da vida'", uma famosa representação dos seres vivos desenvolvida inicialmente por Charles Darwin.

Para Anthony Barnosky, professor emérito da Universidade da Califórnia em Berkeley, a análise mostra que "não só estamos apenas aparando galhos terminais, mas usando uma motosserra para nos livrarmos de grandes braços".

73 GÊNEROS EXTINTOS

Os pesquisadores se basearam, principalmente, em espécies consideradas extintas pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). Eles se concentraram nos vertebrados (excluindo os peixes), para os quais há mais dados disponíveis.

Dos quase 5.400 gêneros (compreendendo 34.600 espécies), concluíram que 73 foram extintos nos últimos 500 anos, a maioria nos últimos 200 anos. Os cientistas então compararam esse número com a taxa de extinção estimada a partir dos registros fósseis existentes.

"Baseados na taxa de extinção em milhões de anos anteriores, esperávamos perder dois gêneros. Mas perdemos 73", explicou Ceballos.

O estudo calcula que essas perdas deveriam ter ocorrido ao longo de 18 mil anos, não 500, embora as estimativas permaneçam incertas, uma vez que nem todas as espécies são conhecidas e o registro fóssil está incompleto.

A perda desses gêneros está associada às atividades humanas como a destruição de habitats para agricultura ou construção de infraestruturas, assim como a pesca predatória, a caça, entre outras.

Isso coloca todo o ecossistema em risco, alerta Ceballos. "Nossa preocupação é que estamos perdendo coisas tão rápido que, para nós, isso é um sinal do colapso da civilização", disse.

HORA DE AGIR

Todos os especialistas ouvidos pela reportagem concordaram que o atual ritmo de extinção é alarmante, mas continuam debatendo se esta situação representa o início de uma sexta extinção em massa —a última corresponde à gerada pelo asteroide que exterminou os dinossauros, há 66 milhões de anos.

Em termos gerais, os cientistas definem uma extinção em massa como a perda de 75% das espécies em um curto período de tempo. Usando essa definição "arbitrária", disse Cowie, uma nova ainda não foi produzida.

Entretanto, se supormos que "as espécies continuarão a ser extintas no ritmo atual, então isso acontecerá", alertou, exaltando que "este é o início de uma potencial sexta extinção em massa".

Mas, para ele, ainda há tempo de salvar muitos gêneros. Para isso é necessário parar a destruição dos habitats naturais e restaurar aqueles que foram perdidos, destacou.

 



21_04

ARTIFÍCIO HUMANO PARA SUPORTAR A DOR FÍSICA

 


Falar palavrões pode fazer bem, de acordo com a ciência

 Estudos sugerem que xingar não só tem benefícios como pode indicar características positivas nas pessoas

Muitos consideram que falar palavrão é algo negativo, tanto mental quanto socialmente. No entanto, a ciência mostra que há benefícios em xingar.
O lado bom dos palavrões vem sendo revelado nas últimas duas décadas como resultado de muitas pesquisas sobre o cérebro e as emoções. Veja alguns deles:
 
Maior tolerância à dor
Pesquisadores da Escola de Psicologia da Universidade de Keele determinaram que xingar pode ter “efeito de diminuir a dor”.
Cada indivíduo de um grupo de 64 voluntários mergulhou a mão em uma banheira de água gelada pelo maior tempo possível enquanto dizia um palavrão de sua escolha. Depois, repetiram o experimento, desta vez usando uma palavra comum que usariam para descrever uma mesa. Os pesquisadores descobriram que os voluntários conseguiam manter as mãos submersas na água gelada por mais tempo ao repetir o palavrão, estabelecendo uma ligação entre o xingamento e o aumento da tolerância à dor.
Pesquisa semelhante revelou que pessoas em bicicletas que praguejavam enquanto pedalavam tinham mais ânimo e força do que pessoas que usavam palavras “neutras”.
De acordo com os autores dos estudos, xingar produz uma resposta ao estresse que dispara o reflexo de defesa do corpo. Uma descarga de adrenalina aumenta a frequência cardíaca e a respiração, preparando os músculos para lutar ou fugir. Simultaneamente, há outra reação fisiológica chamada resposta analgésica, que torna o corpo mais impermeável à dor.
Apenas um alerta: os palavrões perdem a força quando sua usados demais, segundo as pesquisas.
 
Inteligência
Um estudo de 2015 mostrou que pessoas bem-educadas e com bom vocabulário eram melhores em inventar palavrões do que aquelas que eram menos fluentes verbalmente. Os participantes foram solicitados a listar quantas palavras começassem com F, A ou S em um minuto. Outro minuto foi dedicado a inventar palavrões que começassem com essas três letras. Aqueles que criaram mais palavras F, A e S também produziram mais palavrões.
Como a linguagem está relacionada à inteligência, os palavrões podem ser sinal de inteligência, já que pessoas boas em linguagem são boas em gerar um vocabulário de palavrões.
Outro aspecto interessante é que, assim como escolher a roupa adequada para cada lugar ou ocasião, saber o momento de usar um palavrão é também uma habilidade cognitiva social.
 
Honestidade
As pessoas que praguejavam mentiam menos no nível interpessoal e tinham níveis mais altos de integridade em geral, segundo uma série de três estudos publicados em 2017.
Claro que isso não significa que quem usa palavrões não tenha comportamentos antiéticos ou imorais.
 
Criatividade
Falar palavrões é uma ação que ocorre a partir do lado direito do cérebro, a parte que as pessoas costumam chamar de “cérebro criativo”.
Estudos mostram que mesmo pessoas com problemas de saúde que perdem a habilidade de falar, ainda conseguiam xingar. Segundo os pesquisadores, broncas, palavrões e termos carinhosos — que são palavras com forte conteúdo emocional aprendidas cedo — tendem a ser preservadas no cérebro mesmo quando todo o resto da nossa linguagem é perdido.
 
Universalidade
O palavrão é poderoso porque mexe com tabus. Quase todas as línguas têm palavrões. Mas não são apenas as pessoas que aprenderam o poder de usar palavras que causam desconforto.
Na natureza, os chimpanzés usam seus excrementos como um sinal social, para manter as pessoas afastadas. Aqueles criados em cativeiro, treinados com a linguagem dos sinais para dizer cocô e usar o penico, começaram a usar o sinal como fazemos com a palavra m...
“Xingar é apenas uma maneira de expressar seus sentimentos que não envolve jogar merda real. Você apenas joga a ideia de merda por aí”, afirmou Emma Byrne, autora de “Swearing Is Good for You (Dizer Palavrões faz Bem)”, à rede CNN.
Publicado originalmente no jornal Folha de São Paulo